Há quase 5 anos comecei meu projeto de mudança. Tinha em separado e, sem perceber, queria fugir da montanha russa dos sentimentos confusos e dolorosos que me invadiam. Naquele momento fui convencida, e convenci a mim mesma, de que me afastar não seria uma solução. Esperei. Talvez, tenha esperado até mais do que deveria. Foram quatro anos até que eu abraçasse as oportunidades e viesse, finalmente, para São Paulo.
Só que isso de mudar de cidade, deixar tudo para trás não é tão lúdico e fantasioso como se imagina. Não é tão bonito assim. As pessoas tratam como se fosse fácil, descomplicado... não é bem assim. Estudos apontam que uma mudança de cidade está entre os processos mais traumáticos e dolorosos pelos quais uma pessoa pode passar, um dos maiores causadores de depressão. Eu, obviamente, não sabia disso quando fiz as malas. Descobri aos poucos. Descobri diariamente. E ainda descubro. Estar longe de família, de amigos e do conhecido é sofrido. Ao mesmo tempo em que há a delicia de se conhecer algo novo sempre, de se desbravar cidades e ruas, de se fazer novos conhecidos, há o contraponto. A solidão de não se ter alguém confiável por perto, de não se ter um ombro amigo, de não se ter conforto. Em uma nova cidade, quando se é sozinho, se descobre como pessoas podem ser frias, como o céu pode ser cinza, como o silêncio pode ser cruel.
Largar tudo parecia para mim descomplicado e até
delicioso. Parecia que saindo de uma cidade e vindo para outra, toda a carga do passado ficaria para trás. Não ficou. As lembranças continuam conosco. As saudades não nos abandonam, muito menos os arrependimentos. Medos e traumas? Eles continuam conosco, dia-à-dia, acordando e indo dormir. Minha insônia não deixou de existir, e nem meu medo de me relacionar com estranhos, ele até aumentou. Minhas muralhas continuam aqui, e a solidão também. Continuo sendo exatamente a mesma pessoa. Vir para uma cidade nova não mudou minha essência.
Apesar disso, eu sou grata à minha decisão. Estar aqui me oportunizou descobrir mais sobre mim mesma. Acredito que eu hoje me entenda mais do que antes, graças aos tantos momentos de reflexão. Identifico melhor meu comportamento e causas de muitas atitudes. Entendo muitas escolhas que fiz. Essa mudança permitiu que eu soubesse quem realmente deveria estar na minha vida e quem é dispensável. Hoje eu sei que sobrevivo, sim, sozinha e solitária, e sou mais forte do que jamais fui. E por incrível que pareça? Eu me sinto em casa em São Paulo.
Menos de um ano depois de vir morar aqui, eu ainda adoro ir para Porto Alegre e andar pelas ruas lá. As ruas que tanto amo e conheço. Amo visitar os poucos amigos que merecem esse nome, procurar os restaurantes com sabor de saudade e afeto, ficar na casa que foi minha por mais de 10 anos e enchem meu coração de lembranças. E amo ainda mais voltar pro meu canto. Me realizo ao caminhar pelas ruas do bairro em que moro aqui. Adoro percorrer o trajeto de casa ao trabalho. Apesar de todas as dificuldades, eu hoje me sinto bem na cidade que me acolheu. Apesar de não ter deixado para trás o que me incomodava, eu hoje me sinto mais pronta para enfrentar as intempéries desses dias feios. Mesmo com as cicatrizes que não apagaram, é essa cidade que me faz ver que sempre existem coisas novas para aprender, e que há sim, algumas poucas e boas pessoas dispostas a nos ensinar.
Eu poderia ter ficado com o limão. Ou feito uma limonada. No final das contas, descobri que o que fiz foi assar uma deliciosa torta. O resultado foi mais trabalhoso, mas muito melhor.